EDITORIAL — Coronelismo às avessas
“São as vivandeiras alvoroçadas que vêm aos bivaques bulir com os granadeiros e causar extravagâncias ao poder militar” a declaração é de lavra do Marechal Castelo Branco referindo-se aos setores políticos que buscavam nos quartéis apoio de mão armada para depor João Goulart, acusado de comunismo por buscar fazer a reforma agrária, justamente em um país marcado até hoje pela desigualdade social e econômica. Promover a agricultura concedendo terra aos lavradores menos favorecidos era visto como algo inaceitável para elite brasileira à época, assim como até hoje.
De fato, os granadeiros atenderam ao chamado político de setores reacionários da sociedade, deram o golpe de 1964, após isso como sabemos, ou deveriam todos saber, o resto da história é bastante conhecido e nada abonadora para liberdade social e política de milhões de brasileiros.
O fato que chama atenção no presente momento - para análise em nível local - é que mais uma vez o sentimento reacionário da nossa população buscou em quem ostentava por mérito farda e patente a solução dos problemas políticos e administrativos, desta vez não de um país, mas de um município.
A gravidade da falha não se trata do fato de eleger alguém oriundo das fileiras militares, com comprovada capacidade de comando e gestão de assuntos de segurança pública e serviços de alta relevância para nossa sociedade. Muito pelo contrário. O problema não são os granadeiros, mas sim, como antes na história, as vivandeiras alvoroçadas que tornam os granadeiros inapropriados ao exercício do governo.
O raciocínio proposto pode ser um tanto difícil de aceitar em linhas gerais, pois fatalmente contraria o senso comum daqueles que acreditam que suas opções de escolha e ideologias estão acima de qualquer suspeita ou descrédito. Fica a ressalva ao leitor menos habituado ao atrevimento de pensar fora da sua zona de conforto intelectual.
O desafio aqui, no entanto, é notar que ao redor da prefeita eleita que patrocinou um discurso de renovação política e administrativa com choque de gestão e competência infalível, inclusive apelando ao sobrenatural, estão secretários desprovidos da competência técnica, sagacidade política e capacidade de trabalho árduo por ela prometidos. Simples assim.
Logo no primeiro mês de governo o que tomou conta - em toda urbe - foram os comentários desabonadores sobre as atitudes da prefeita. As críticas de aumento de salário de secretários, nomeações de cargos para indicados por pessoas influentes ao seu redor, alteração de data de pagamentos de servidores públicos, em contraste oposto ao enredo eleitoral e pós eleitoral de eficiência na gestão, com dever de optar pela estrita legalidade e impessoalidade acima de qualquer "bulinação das vivandeiras" da política municipal.
De cara e repetidas vezes, os tão aclamados secretários da prefeita são vistos comemorando e tomando alegremente rodadas de cervejada em bar de apoiador político da ilustre prefeita. Não achem que o povo aceita uma cena dessas sem passar batido, sem lançar olhar de desdém por quem ocupa cargos elevados com altos salários pagos com tributos sob crivo da execução caso não pague-se. Cada gole tomado é com dinheiro do povo nessa ocasião daqui por diante, estejam cientes disso. Logo, a crítica ferina popular logo sobreveio aos ditos cujos, sendo eles merecedores ou não do trato de repulsa. O fato colateral a isso, que qualquer pessoa com tino político mais aguçado percebe, é que basta esse tipo de coisa vir à tona para a reputação do governo também se esvair pelo ralo.
Outro ponto a ser debatido: A governante da cidade que deveria estar sendo governada com esmero e compreensão com sintonia fina das angústias dos bairros e moradores, simplesmente é vista fechada às portas em reuniões surgindo apenas para comunicados sem maiores significados por meio da vitrine das redes sociais.
Em tese, poderíamos dizer, usando uma analogia da religião, que estamos diante de mais um pastor sem cheiro do rebanho. Os mais atiçados podem até dizer que se tratava de "lobo em pele de cordeiro", pois na eleição a candidata com vigor esteve criticando cada buraco e cada relva acima dos tornozelos, mas agora, ora, mesmo estando a par da situação nada favorável aos cidadãos, passa longe de qualquer bairro preferindo os aposentos do palácio municipal para ficar na companhia das vivandeiras que lhe tecem sempre entendimentos favoráveis de cada situação.
Entendimentos muitas vezes falseados, sem exatidão ou compreensão do que esteja de fato se passando. Todavia, muitos dos interlocutores com cargos jamais ousam alegar uma negativa realista, pois existe temor em perder a posição de alta estima e cargo bem pago. Sendo assim, o melhor é concordar inclusive com aquilo que é entendido de forma equivocada ou mal feito às custas da decisão da prefeita.
Certo de que estamos escrevendo para pessoas com estima por alguma cultura política mínima que seja, cabe a inteligência de cada um fazer sua própria conclusão. O que interessa nesse contexto é pontuar e mostrar mais uma vez que o vício da dita "velha política" permanece entranhado na prefeitura municipal de Itapeva.
Mudaram os nomes nas placas de futuras inaugurações, porém os velhos hábitos da politicagem permanecem os mesmos de antes. Muito disso em razão do prefeito de ofício no mandato manter ao seu lado os aduladores e bajuladores que servem de vassalagem para qualquer atropelo pretendido pelo eleito do povo. Notem que nada mudou em relação a isso, as pessoas mudaram, mas o cinismo do poder subindo a cabeça pincelado com tons de demagogia permanece o mesmo de antes.
Ao que parece, não temos mais uma coronel disposta e certeira de suas palavras de ordem, pois até aqui tudo que foi dito, nada foi cumprido conforme o dito, pois foi somente peça de marketing.
Não se trata da questão do tempo hábil para fazer determinadas ações de governo, mas sim de como tem sido feito, ou de como está passando longe do que foi dito. Até porque muitas vezes a forma prejudica o conteúdo. Aqui sim, cabe espaço para o povo despejar sua insatisfação diária, pois muitas vezes a falta de uma satisfação e previsão com informações corretas por parte da assessoria é o rastilho de pólvora que leva o povo a explodir em críticas enxergando com exatidão apenas o lado podre do que já apodreceu.
Em contraponto, a esperança de que tudo irá funcionar bem cabe aos iludidos com discursos fáceis de redes sociais, até porque postagens não são atos de governo, são apenas propaganda, tanto do que é feito como daquilo que não está sendo feito. Por enquanto, o pouco que foi feito, foi feito com aquele jeitão da velha política porque é velha política sendo requentada. Embora alguns ainda insistam, no discurso da renovação garantida, são cada vez menos adeptos dessa peça de marketing, por conta da decepção inicial com o governo de fato.
O povão caiu na real, a rejeição está fermentada, logo a popularidade cai e não serão as falácias ditas nas redes sociais a tábua de salvação deste governo. O pino da granada está solto, mas a granada fica na mão da nossa destemida granadeira pelos próximos quatro anos. Portanto, cuidado com as vivandeiras ao redor no acampamento, pois elas muitas vezes abandonam a batalha no meio da luta. Isso quando lutam...

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