Pesquisador itapevense se destaca no Globo Rural com nascimento dos primeiros bezerros geneticamente editados no Brasil
Projeto da Embrapa de Juiz de Fora (MG) em parceria com a
Associação Brasileira de Angus marca avanço inédito na América Latina. Segundo
o itapevense Luiz Sérgio de Almeida Camargo, objetivo é criar bovinos mais
resistentes ao calor por meio da edição genética em embriões fecundados in
vitro.
O Brasil acaba de alcançar um marco histórico na pecuária de
corte. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em parceria com
a Associação Brasileira de Angus, anunciou o nascimento dos primeiros bezerros
geneticamente editados da América Latina — um passo inédito no continente que
posiciona a bovinocultura nacional na vanguarda da biotecnologia aplicada à
produção animal. O feito é resultado do uso da técnica de edição genética
CRISPR/Cas9, aplicada a embriões Angus fecundados in vitro, com o objetivo de
criar animais mais adaptados ao clima tropical.
Foto: Rubens Neiva
Os cinco bezerros nasceram entre o fim de março e o início
de abril, e pelo menos dois deles já demonstraram a característica desejada:
pelos curtos e lisos — um indicativo de maior resistência ao calor. A alteração
genética foi confirmada pela Embrapa Gado de Leite, em Minas Gerais, que
conduziu o sequenciamento genético dos filhotes e atestou o sucesso da edição
no gene relacionado ao controle da temperatura corporal.
“Trata-se de uma conquista científica e produtiva. Pela
primeira vez no continente conseguimos editar embriões bovinos para conferir
uma característica que melhora a adaptação dos animais ao ambiente, sem alterar
suas qualidades produtivas”, afirma Luiz Sérgio de Almeida Camargo, pesquisador
da Embrapa e um dos responsáveis pela pesquisa.
A tecnologia utilizada, CRISPR/Cas9, é frequentemente
referida como um sistema de "edição genética de precisão". Inspirada
em um mecanismo natural encontrado em bactérias, a técnica funciona como uma
tesoura molecular capaz de alterar sequências específicas de DNA com altíssima
precisão.
No caso dos bezerros Angus, a intervenção focou na
modificação do gene receptor da prolactina, cuja mutação induz ao
desenvolvimento de pelos mais curtos e finos. Essa característica, comum em
raças tropicais, está ausente em raças europeias como Angus e Holandesa,
conhecidas por sua alta produtividade, mas pouco adaptadas a ambientes quentes
e úmidos.
A estratégia permite suprimir a necessidade de cruzamentos
sucessivos, um método que, em geral, levaria gerações para consolidar uma
característica desejada no rebanho. “Agora conseguimos, em uma única geração,
criar animais com alta performance zootécnica e mais tolerância ao calor — um
diferencial especialmente importante frente ao avanço das mudanças climáticas”,
detalha Camargo.
Para realizar a modificação, a equipe de pesquisadores da
Embrapa utilizou a eletroporação de zigotos — técnica inovadora que aplica
breves pulsos elétricos sobre o zigoto (célula formada após a fecundação) para
tornar temporariamente permeável sua membrana, permitindo a entrada das
moléculas de edição genética.
Considerado menos invasivo e mais eficiente do que as
abordagens tradicionais, esse método tem se mostrado promissor para viabilizar
a edição genética em escala comercial, com menor custo e maior segurança.
“Essa abordagem representa um ganho técnico expressivo.
Trabalhar com zigotos, ainda nas primeiras horas após a fecundação, aumenta as
chances de uma edição eficaz e uniforme em todos os tecidos do animal adulto”,
acrescenta o pesquisador.
Os cientistas esperam que os animais editados apresentem
desempenho superior em regiões tropicais, com menor estresse térmico e,
portanto, maior bem-estar e produtividade. A tendência é que bovinos mais
adaptados ao calor tenham melhor desempenho em ganho de peso, eficiência
alimentar e reprodução.
Com isso, a pecuária nacional poderá manter raças de
excelência zootécnica — como a Angus — em sistemas produtivos no Brasil sem os
prejuízos normalmente associados ao desconforto térmico.
“Essa combinação entre genética de elite e adaptação
ambiental pode representar um novo paradigma para a pecuária de corte,
especialmente em tempos de aquecimento global”, observa Mateus Pivato,
diretor-executivo da Associação Brasileira de Angus e Ultrablack.
Apesar do sucesso inicial, o trabalho está longe de
terminar. A próxima etapa da pesquisa será monitorar o desenvolvimento dos
bezerros e, principalmente, investigar a possibilidade de transmissão da
característica para seus descendentes — o que permitirá, a longo prazo, a
multiplicação natural dos genes editados em rebanhos comerciais.
“Estamos avaliando tanto o desempenho fenotípico desses
animais quanto a fidelidade da edição genética. Precisamos confirmar que não
houve alterações fora do alvo no genoma, o que garantirá a segurança da
técnica”, explica Camargo.
Caso a hereditariedade seja confirmada, a previsão é que os
próprios filhos dos animais editados possam servir como base para a difusão da
característica em larga escala, reduzindo o tempo de adaptação do rebanho
nacional às condições tropicais.
Além dos ganhos zootécnicos, o avanço também pode contribuir
com o posicionamento estratégico da carne brasileira no mercado internacional.
Com a demanda crescente por práticas sustentáveis e foco em bem-estar animal,
animais geneticamente preparados para climas tropicais — sem necessidade de
sistemas artificiais de resfriamento ou manejo intensivo — ganham
competitividade.
“Esse trabalho é uma resposta concreta à demanda global por
uma produção pecuária mais ética, eficiente e ambientalmente adaptada”, avalia
José Paulo Cairoli, presidente da Associação Brasileira de Angus. “Gerar os
primeiros bezerros editados da América Latina é um marco, e é uma grande
satisfação ver a Associação participando desse processo histórico.”
O nascimento dos bezerros geneticamente editados representa
mais que um avanço tecnológico: aponta para o início de uma nova era na
pecuária nacional. Em um cenário de mudanças climáticas, demanda por
sustentabilidade e competição global acirrada, a inovação científica se torna
pilar estratégico.
A expectativa é que os estudos da Embrapa, que já
demonstraram viabilidade científica, avancem agora para fases de validação
comercial e regulamentação sanitária. Caso os dados se consolidem, o Brasil
poderá ser o primeiro país a integrar plenamente animais geneticamente editados
à cadeia de produção bovina — reforçando o protagonismo da ciência agropecuária
nacional.
Com bezerros que já nascem prontos para os desafios do
século XXI, o Brasil sinaliza ao mundo que não apenas produz carne — mas também
produz conhecimento, inovação e tecnologia de ponta.
Nesta segunda-feira, 19 de maio, a sessão da Câmara Municipal de Itapeva foi marcada
por homenagens. O voto de congratulações, apresentado pelo vereador Robson
Leite (MDB), foi aprovado pelo plenário, onde reconhece o trabalho do
itapevense, Luiz Sérgio de Almeida Camargo, pesquisador da Embrapa e
protagonista no projeto de edição genética de bovinos, que resultou no
nascimento dos primeiros bezerros editados do Brasil.
Colaborou: Embrapa
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